Pioneiros

A aventura dos nossos pioneiros não começou no momento em que eles se despediram das suas famílias, nem no momento em que embarcaram num navio repleto de estranhos, nem no dia em que chegaram ao seu destino. O início é um ponto ofuscado que engloba todas essas ocorrências, pois alguns deles demoraram a chegar...mesmo que já estivessem aqui.

Aqueles 69 homens que desembarcaram no Saturnia naquele fatídico 13 de maio de 1953, escolheram o Canadá com a intenção de melhorar a vida das suas famílias. Nesse processo, mal sabiam eles que estariam a ajudar os portugueses que chegariam depois.

Não há história sem começo, e a nossa começa com eles. É por culpa da sua coragem e sacrifício que todos nós fomos capazes de imigrar para o Canadá e nos integrarmos rapidamente, independentemente do nosso estatuto no país e até mesmo da nossa origem. Desde que falássemos e compreendêssemos o português, facilmente nos tornavamos parte da comunidade.

É a eles que devemos a nossa presença aqui.

Esta página pretende homenagear todos os que aqui chegaram primeiro, não só os que viajaram no Saturnia, mas também os que vieram depois e que ajudaram a moldar as nossas comunidades. Para atingir esse objetivo, precisamos da ajuda de todos.

Se conhece a história de alguém que chegou ao Canadá na década de 1950 ou início dos anos 60, por favor Contacte-nos. Por outro lado, se conhece alguém que chegou depois, mas ajudou a formar uma comunidade específica, também estamos interessados em conhecer a história.

Juntos, vamos escrever a nossa história!

Perfis pioneiros

Esta página é patrocinada por:

Início oficial da Imigração Portuguesa

O início oficial da imigração portuguesa para o Canadá é o dia 13 de maio de 1953, quando 69 homens desembarcaram no cais 21, em Halifax, a bordo do navio Saturnia. Mais tarde, ainda naquele mês, outros sete homens chegaram a bordo do Vulcaniae, ainda mais tarde, cento e três desembarcaram do Nea Hellas. Até ao final dessa década, muitos outros milhares chegaram a Halifax para depois se espalharem por todo o país, principalmente para trabalhar nos caminhos de ferro ou na agricultura.

Fernando Candido, um luso-canadiano, fez uma extensa pesquisa sobre o grupo que chegou a bordo do Saturnia. Saiba mais em aqui.

Embora 1953 represente o início oficial da nossa presença no Canadá, outros portugueses já antes haviam imigrado para o Canadá quando aquele grupo chegou ao país. De facto, a relação entre os dois países remonta a séculos – os pescadores portugueses já pescam ao largo da costa da Terra Nova há mais de 500 anos e, nesse processo, deixaram marcas duradouras na região. No entanto, muito poucos decidiram ficar permanentemente.

De que haja conhecimento, o primeiro português a residir permanentemente no Canadá é Pedro da Silva, que é considerado o primeiro carteiro do país. A sua história está amplamente documentada em várias publicações. Saiba mais sobre a sua história aqui: https://www.tfcg.ca/pedro-dasilva. Bill Moniz, jornalista e realizador português residente em Toronto, publicou um documentário sobre Pedro da Silva que pode ver aqui.

Outro famoso luso-canadiano que residiu aqui antes da primeira onda de imigração de Portugal é José Silva, que ficou conhecido como Joey Silva e, mais notoriamente, como Portuguese Joe. Ele foi fundamental no moldar do caráter de British Columbia da época e, como tributo à sua contribuição para a província mais ocidental do Canadá, foi-lhe erguida uma estátua no Stanly Parkl, em Vancouver. Por favor, siga este link para saber mais sobre a sua história: http://shoretoshore.ca/story.php. Bill Moniz também produziu um documentário sobre a história deste notável luso-canadiano, que pode ver aqui.

Pier 21

Durante mais de uma década, a maioria dos portugueses que chegavam ao Canadá desembarcavam no Cais 21, em Halifax. Aliás, foi isso mesmo que aconteceu com todos os imigrantes europeus que escolheram o Canadá como destino. Dada a importância do cais para o desenvolvimento do país, o Governo Federal criou o Canadian Museum of Immigration at Pier 21, um espaço que contém inúmeras exposições e histórias sobre muitos dos recém-chegados que ali desembarcaram. Consulte o website to museu aqui: https://pier21.ca/.

O museu contém documentos interessantes, como listas de passageiros em navios específicos. Contém ainda perfis de muitos dos milhares de imigrantes que ali desembarcaram. Uma dessas histórias é sobre António Fernandes Moreira, um recém-chegado que faz parte do Sobey Wall of Honour do museu e que entrou no Canadá a 14 de abril de 1955. Saiba mais sobre este pioneiro aqui.

Se um dia for a Halifax, faça questão de visitar o Canadian Museum of Immigration at Pier 21 para homenagear aqueles que abriram caminho para a nossa presença no melhor país do mundo: o Canadá. 

Galeria dos Pioneiros Portugueses

A Galeria dos Pioneiros Portugueses está localizada em Toronto, no 960 St. Clair Avenue West. A galeria é uma criação do empresário luso-canadiano Manuel da Costa, que também fundou a Portuguese Wall of Fame, em Toronto. O website do museu lista Lenita Lopes como curadora.

Para aqueles que não podem visitar o museu pessoalmente, a organização tem um website onde muitos dos pioneiros, incluindo aqueles que chegaram no Saturnia, são perfilados. Trata-se da mais completa coleção de artigos e histórias sobre o assunto no Canadá.

Para conhecer melhor o conteúdo do museu e principalmente sobre o perfil dos nossos pioneiros, visite https://pioneersgallery.ca/

Carlos Pereira: um verdadeiro pioneiro

Nome:Carlos pereira
Naturalidade:Autoguia da Baleia, Peniche
Chegada ao Canadá:Píer 21 (Halifax), maio de 1953

Em 2003, tive o prazer de conversar com Carlos Pereira sobre a sua vida como imigrante no Canadá. Natural de Autoguia da Baleia, Peniche, desembarcou no Pier 21 em 1953. Trata-se de um verdadeiro pioneiro que dedicou a sua vida à família e à comunidade, deixando um legado e exemplo para as futuras gerações de luso-canadianos.

O seu nome é Carlos Pereira. Nasceu em 1918 na Autoguia da Baleia, Peniche. Exerceu a profissão de moleiro até decidir viajar para o Canadá. A sua esposa, Olinda Pereira, oriunda da mesma freguesia, nasceu em 1919. Juntos tiveram quatro filhas.

O avô do Sr. Carlos tinha três filhos e deu um moinho e grandes propriedades a cada um. Era um homem muito rico. “O que ele tinha, hoje era uma fortuna”, disse. O mais velho dos filhos ficou com o moinho maior, mas morreu pouco tempo após o falecimento da sua mãe. De repente, num período de apenas dois ou três anos, morreu outro filho. “O meu pai, então, comprou os moinhos”, ficando assim com três moinhos. O Sr. Carlos Pereira começou de muito novo a ser conhecido como um bom trabalhador. “Eu, aos sete anos, comecei a dormir e a trabalhar no moinho”, atirou. O seu pai não dependia só de si para o trabalho, pois também tinha um criado. Já moço, quando Carlos Pereira veio da tropa, o seu pai comprou uma casa que era do seu avô, e vendeu um dos moinhos. Os seus pais tinham bastantes posses, mas eram frugais, e após o seu casamento com a Dona Olinda, Agostinho foi obrigado a comprar o seu próprio moinho. “A família toda tinha bastante dinheiro, mas ninguém me ajudou em nada”, recordou.

A esposa, sentada num sofá ao seu lado, confirmava tudo: “Ninguém o socorreu, mas eu trabalhava num alfaiate.”

Perguntei-lhe o que o levou a vir para o Canadá e a resposta foi imediata: “As quatro filhas. Tinha quatro filhas e uma casa que tinha comprado”, disse. O padre da terra, ao saber das dificuldades que o Sr. Carlos estava a passar, aconselhou-o a ir à Câmara Municipal preencher os papéis para emigrar para o Canadá. Seguindo esse conselho, deslocou-se à Câmara Municipal e inscreveu-se. “Tive sorte porque foram muitos a fazer a aplicação”, disse.

Olinda reiterou a sorte do marido, que foi um dos últimos a preencher o requerimento.

Na altura, a decisão não foi recebida com agrado por todos os membros da família, como Carlos Pereira nos informou: “A minha mulher não queria que eu viesse.” Pensava que não era necessário pois julgava ter uma vida boa em Portugal. “Ao pé de alguns, comprei um moinho sem ter um tostão e passado um tempo gastei mais no moinho do que por quanto o tinha comprado. Depois, passados uns anos, comprei a casa”, lembrou. Era uma pessoa corajosa.

A 13 de maio de 1953, embarcou para o outro lado do mundo. Começou por trabalhar num campo perto de Otava. “Trabalhei a tirar leite a vacas”, atirou. Tinha de cortar gelo para manter o leite fresco. O gelo era adquirido no rio e depois cortado com o sarrote para ser então transportado no carro. “Fui ao casamento dos filhos do patrão”, disse. Esteve quase três meses a trabalhar num campo a ganhar $75 por mês, o que achava ser muito pouco. “Eu pensava: mas como é que vou ganhar dinheiro para mandar à família?”

Quando decidiu abandonar o emprego na lavoura, os patrões ficaram desapontados. Telefonaram para Otava a perguntar a razão da sua decisão. A resposta foi óbvia: “Vou para arranjar trabalho em Montreal.”

Deslocou-se ao consulado em Montreal para averiguar se havia uma maneira de chamar a família para junto de si. “Disseram-me que tinha que estar cá pelo menos quatro anos e depois é que podia mandar vir a família. Um rapaz de nome Viola aconselhou-me a ir procurar trabalho em Montreal.” Deu-lhe a direção e assim partiu o Sr. Carlo Pereira para uma nova transição da sua vida.

Pouco tempo após a sua chegada a Montreal, arranjou trabalho nos caminhos de ferro onde começou a ganhar bom dinheiro. Provou mais uma vez que era bom trabalhador. “Nos comboios a gente era para trabalhar de noite e de dia. Ninguém trabalhou noite e dia, só eu”. Eram dois empregados num local e o Sr. Carlos Pereira sozinho noutro local.

Os patrões gostavam de o ter como empregado. O Sr. Carlos tinha muita facilidade em trabalhar martelos grandes. Perguntou uma noite ao patrão quando é que se ia embora, e ele com o pouco espanhol que sabia questionou a pergunta: “Não precisas de dinheiro? Então, deixa-te estar.” O Sr. Carlos Pereira trabalhou assim duas noites e dois dias sem parar. Tinha 34 anos e meio na altura. Em outras alturas foi injustamente maltratado: “Um dia estava a 60 abaixo de zero. Você congelava a e não dava por ela, não fomos trabalhar e o patrão despediu-nos a todos.” Regressou a Montreal, e com a sorte de Deus, pois não era fácil encontrar trabalho, arranjou emprego como pintor.

Juntou dinheiro suficiente para visitar o país de origem e ao fim de XNUMX meses de cá estar, embarcou para Portugal via França na intenção de ficar em Portugal por XNUMX meses. “Foi o dia mais feliz da minha vida…eu nunca conseguia estar um dia sem ver as minhas filhas.”

De Seguida, veio morar para Toronto onde teve imensa dificuldade em arranjar casa para alugar devido ao número elevado de membros da família. “Tive que comprar uma casa porque ninguém me alugava uma casa e com as quatro filhas.” Treze meses depois, contra a vontade da esposa e das filhas, a restante família chegou ao Canadá. “Quando a mulher veio para aqui, já passava cheques para uma casa.” A casa, na Lisgar Street, satisfez a esposa. “A casinha era jeitosa.”

O trabalho que o Sr. Carlos desempenhava em Toronto era o de fazer camas. A sua esposa, Sra. Olinda Pereira, arranjou trabalho numa fábrica de costura onde cosia bolsos usando a máquina de costura. Fazia assim o trabalho de duas outras mulheres durante todo o ano. “Eu trabalhava numa casa muitas vezes das XNUMX às nove da noite. Trabalhei lá sete anos e nunca tive férias.”

Em 1958, compraram uma quinto perto de Orangeville. O primeiro grande encontro ao ar livre da comunidade portuguesa em Toronto aconteceu na propriedade em 1963. “Foram os madeirenses que a fizeram.” Dava-se muito bem com todos, mas especialmente com os madeirenses. A vida, no entanto, dá muitas voltas: “Em 1974, vendi o farm e abri um supermercado na Augusta.” A Sra. Olinda interveio e acrescentou: “Ele não ligava muito ao supermercado, eu é que estava encarregada da loja.” Conta também que todos os fregueses eram portugueses. “Os alentejanoseram mais os meus fregueses. Nos primeiros anos era tudo ali perto da Augusta.” Contam também que as suas filhas eram muito privilegiadas pois na altura de suas juventudes haviam poucas mulheres solteiras na comunidade e as raparigas eram bem cortejadas. Gozavam sempre da companhia do pai. “Quando vinham das festas, as festas acabavam logo."

Nenhum outro membro da família, seja do lado de Carlos ou de Olinda, emigrou para o Canadá.

Por ocasião da celebração do cinquentenário da presença portuguesa no Canadá, Maria Franciso Salvador Bruno escreveu o seguinte poema dedicado a Olinda e Carlos Pereira:

. .

Para Carlos Autoguia:

É ao Sr. Carlos Pereira
Que todos nós aqui encontramo-nos a homenagear
Por ser o primeiro autoguiense
Às terras do Canadá chegar
Foi em 13-1953-de maio e ele embarcou
Depois muitos mais vieram também
Pedido à virgem que os guiasse
Senhora da Conceição que és nossa mãe
E assim foi que se formou
Esta tão grande família que é a imigração
Que Deus a todos de muita saúde
Muito amor, muita harmonia e paz no coração
Todos deixamos nossa terra
Com esperanças de voltar
Muitos sentem-se felizes em circunstâncias
Não mais irão regressar
Bem hajam todos os autoguienses
E todos os imigrantes como tal
Bem haja este grande país que nos acolheu
Bem haja a nossa Pátria que é Portugal!

A resposta de Carlos Pereira foi a seguinte:

Foi com grande amizade
Que aqui nos reunimos
Para recordar os bons tempos passados
Assim nós nos divertimos
Fiquei muito comovido
E sinceramente vos quero agradecer
Por este bocadinho que passamos
E espero em breve vos tornar a ver

Na altura da nossa conversa, em 2003, Olinda e Carlos Pereira moravam em Mississauga há já 37 anos. As paredes, recheadas de fotos, lembravam um museu repleto de memórias fde tempos passados. Naquele ano, eles comemoraram 61 anos de casamento. Na altura, revelaram que o segredo para um relacionamento de sucesso baseava-se na paciência e na compreensão, e que a sua fórmula para uma vida longa e saudável baseava-se em não serem egoístas, ciumentos ou apaixonados por dinheiro. Após se reformar, Carlos manteve-se ocupado talhando peças em madeira, e Olinda ocupou seu tempo livre a fazer bordados, os quais presenteava aos seus netos e bisnetos.

Agostinho Martins: um homem de família e da comunidade

Nome:Agostinho Martins
Naturalidade:Madeira
Chegada ao Canadá:Píer 21 (Halifax), março de 1957

Em 2003, tive a oportunidade e a honra de conversar com Agostinho Martins, um luso-canadiano que chegou ao Canadá em 1957. Para além do seu contributo para o desenvolvimento da comunidade portuguesa em Toronto, desempenhou também um papel importante em alguns das nossas organizações sem fins lucrativos. Fez parte do Portuguese United, associação que hoje fica na memória. Foi também um dos fundadores da Casa da Madeira e diretor da secção de futebol do First Portuguese. Foi funcionário da Comissão de Trânsito de Toronto (TTC) a maior parte de sua vida. Foi condutor de camionetas, elétricos, e metro.

Agostinho Martins nasceu na Madeira em 1938, numa altura em que Salazar governava Portugal. Esses tempos não eram os mais propícios ao florescimento da capacidade humana. Consequentemente, tal como muitos outros, este madeirense decidiu aventurar-se no alto mar em busca de um novo começo e de melhores oportunidades. 

A sua irmã, Conceição Nunes, foi o trampolim para a vinda de Agostinho Martins para o Canadá. “Vim para aqui com 18 anos. Em Portugal, nessa altura em trabalhava numa loja de louças e a razão que eu vim para aqui é porque tinha cá uma irmã, que veio em 1954”, relatou. Por essa altura, vivia-se o conflito entre Portugal e a Índia e, por culpa da sua idade, o Sr. Martins corria o risco de ser recrutado para o Oriente. “Era capaz de ser chamado para a Índia e, com a carta de chamada, vim para o Canadá”, reiterou. Par além da sua irmã, Agostinho Martins reconhece também a influência dos seus pais que perspetivavam um melhor futuro para o seu filho.

A partida é sempre a etapa mais difícil porque o desconhecido esconde-se para além das ondas de um mar imenso. Na mistura da mágoa da partida e da ansiedade do destino, iniciou a sua viagem no dia 16 de fevereiro de 1957. “Saí de barco para o continente e, no mesmo dia que desembarquei, a raínha Elizabete (de Inglaterra) também estava a desembarcar… e eu vi-a”, recordou com um sorriso. “Depois vim de barco até Nova Iorque, depois para Halifax”, comentou. A viagem entre Nova Iorque e Halifax foi mais demorada do que o previsto devido ao extremo mau tempo que se fazia sentir no mar. “Foi uma viagem longa”, lamentou para depois continuar: “No barco vinham muitos refugiados da Hungria e não havia muito espaço”. Para além disso, os navios de então não tinham o conforto dos atuais. Agostinha Martins recordou, com nostalgia, que dormiam quatro pessoas no mesmo quarto em condições que hoje seriam consideradas intoleráveis.

Agostinho Martins

Ao contrário de muitos outros pioneiros, o Sr. Martins considerou-se afortunado por ter sido recebido por pessoas conhecidas de quem também obteve o apoio necessário durante o sempre difícil período de adaptação. “A minha irmã estava à minha espera com o meu cunhado e sobrinho”, lembrou.

Apesar de ter sido obrigado a deixar para trás os seus amigos e a sua família, o sentido de aventura e de curiosidade de Agostinho Martins tornaram a sua vinda para o Canadá como algo de positivo e do qual nunca se arrependeria. “Sentia falta dos amigos, mas aqui encontrei outros amigos. Nunca tive medo e estava com confiança que ia correr tudo bem. Nunca pensei que fosse uma asneira (imigrar para o Canadá)”, referiu.

Ao chegar a Toronto, ficou deveras deslumbrado. Ao contrário de Portugal, o Canadá parecia ter o dom da oportunidade e a dádiva da liberdade, duas características que depressa lhe chamaram a atenção. “Aqui não se podia comparar com a nossa terra. Tudo o que se encontrava aqui era uma coisa de encantar. Já via mesmo dentro de mim que aqui tinha um futuro”, confessou. Decidido, Agostinho Martins começou a aprender inglês no St. Christopher House, local onde confraternizava e onde manteve boas amizades. “Às vezes a gente ia lá para a brincadeira e aprendíamos um bocadinho de inglês. Os estudos que tive foram poucos, mas nunca tive dificuldades em inglês”, relatou.

Hospedado em casa da sua irmã, O Sr. Martins começou de imediato à procura de emprego. A vida não era fácil para os imigrantes de então porque, para além da falta de estudos, a língua continuava a ser um grande obstáculo para quem tinha vontade de trabalhar. “Estive seis semanas sem trabalhar e depois arranjei um trabalho num restaurante”, lembrou. A sua perseverança e o seu entusiasmo confiaram-lhe a vontade de conseguir algo mais e, tempos depois, conseguia um emprego na comissão de transportes públicos de Toronto (TTC). “Estive um ano no Greycoach, mas devido à família, voltei aos streetcars”, recordou. A sua experiência como condutor passou pelas camionetas, pelos elétricos e pelo metro, reformando-se aos 60 anos de idade. Para além da satisfação profissional, o Canadá também lhe proporcionou a oportunidade de construir uma família. “Conheci a minha mulher aqui e quando casei fui morar para casa dos meus sogros, na Shaw Street. Tenho quatro filhos e seis netos – uma rapariga cinco rapazes”, contou-nos por altura da nossa conversa, em 2003.

O envolvimento comunitário de Agostinho Martins tem sido exemplar desde que começou a inserir-se na comunidade portuguesa de Toronto. “Sou sócio fundador da Casa da Madeira e do parque. Sou o sócio número oito e fui presidente do clube duas vezes”, contou. O seu primeiro mandato ocorreu em 1982 e o segundo em 1994, altura em que a atual sede foi adquirida. “Foi a minha direção que comprou a casa que temos agora”, relatou, orgulhoso. Para além de presidente da direção executiva, Agostinho Martins desempenhou ainda as funções de Presidente da Assembleia no ano de 1971.

As suas muitas décadas de participação voluntária na Casa da Madeira têm sido constantes, seja como diretor ou apenas como sócio. Ainda antes da formação da Casa da Madeira, Agostinho Martins já fazia parte de uma outra organização chamada Portuguese United. “Andei nesse clube em 58 ou 59. Andei também no futebol do First Portuguese. Quando estiveram cá os jogadores do Belenenses, eu era diretor do First”, revelou. O seu contributo no First Portuguese foi apenas a nível de diretor da secção de futebol, mas nunca chegou a integrar o corpo executivo desta organização.

Em 2003, à data da nossa conversa, Agostinho Martins era Diretor de Relações Públicas da Casa da Madeira.

Devido ao facto de ter chegado a Toronto numa altura em que a comunidade ainda se procurava organizar, Agostinho Martins tornou-se um profundo conhecedor de muitas vertentes que fazem parte dessa evolução. “A nossa comunidade, na altura que eu cheguei, era pequena. Hoje está desenvolvida. Temos muitos clubes, o que não sei se é bom ou mau. Mas nos ranchos vê-se muita rapaziada nova, o que é uma coisa que está a andar melhor do que esperava”, comentou.

Agostinho Martins, um dos nossos pioneiros da década de XNUMX, apesar de ter abandonado a sua terra ainda muito jovem, sempre a celebrou através do seu contributo como voluntário em diversas organizações comunitárias. Para além de ter desempenhado um papel fundamental na evolução da nossa comunidade, foi também preponderante no movimento associativo, o que o torna um luso-canadiano digno de relevo. É a pessoas como Agostinho Martins que devemos a nossa presença aqui.