Grupo Cultural Cana Verde

Data de Fundação:1979
Contato:https://www.facebook.com/groups/grupoculturalcanaverde

UMA ORGANIZAÇÃO QUE SE ADAPTA AOS TEMPOS DE MUDANÇA

Versão de áudio (disponível apenas em inglês):

Nas três décadas que sucederam a chegada dos primeiros portugueses a Montreal, o folclore foi representado na comunidade por apenas um grupo infantil. Foi somente em 1979 que o primeiro rancho adulto surgiu quando Fernando Pires deu um importante passo para formar aquele que viria a ser o atual Grupo Cultural Cana Verde. Uma organização com laços familiares desde a sua criação, o rancho tem conseguido prosperar e sobreviver, até aos dias de hoje, devido a esses laços estreitos e à sua capacidade de adaptação aos tempos de mudança. Os seus fundadores foram Fernando Pires, Ilda Januário, Lidia Fontes Ribeiro e Fátima Martins.

A irmã de Fernando Pires, Joaquina, fez parte do projeto desde o primeiro dia e, mais tarde, foi responsável pelo ressurgimento do grupo após uma interrupção em meados dos anos oitenta. Esta segunda vida foi apoiada por muitos jovens luso-Canadianos que se tornaram pilares importantes na sustentabilidade do rancho. Carla Oliveira é uma dessas jovens que tem contribuído para a divulgação e preservação do folclore português, tanto em em Montreal como também noutras partes do Canadá. Em janeiro de 2022, conversámos com as duas senhoras para conhecermos melhor a História do Grupo Cultural Cana Verde.

“Em 1979, o meu irmão Fernando começou a trabalhar na Igreja Anglicana e organizou diversas atividades para a comunidade. Na época, tínhamos apenas um grupo folclórico em Montreal, mas era formado apenas por jovens. Não tínhamos um grupo de adultos. O meu irmão conhecia algumas pessoas que mostraram algum interesse, que gostavam de dançar, e um dia, num café, colocaram a questão: e se formássemos um grupo folclórico adulto?” Joaquina Pires começar por revelar. “Vimos de uma aldeia chamada Soajo [Arcos de Valdevez] e começámos a recrutar pessoas de lá, pessoas que conheciam as danças. Foi assim que me envolvi. Depois, começámos a recrutar pessoas que não eram necessariamente do Soajo porque, na altura, só tínhamos aqui três famílias com idade para dançar [num grupo de adultos]. Escolhemos o nome Grupo Cultural Cana Verde porque queríamos que o grupo fosse mais culturalmente inclusivo”, lembrou.

Embora no seu início o grupo tenha assumido um tom informal, os seus integrantes começaram a preparar-se para a eventualidade de receberem convites para dançar em eventos comunitários. Consequentemente, a escolha do traje tornou-se um ponto de discussão. “Optámos por um traje tipicamente Soajeiro [que consistia] numa saia preta, uma camisa branca e um lenço colorido [para as mulheres], e para os homens calça preta, camisa de linho branca, faixa preta e chapéu. A minha mãe fez os primeiros trajes. Lembro-me de passear por todas as lojas de Montreal à procura de linho para as camisas dos homens e das mulheres, ou algo que se parecesse com linho. Como não encontrámos nada, a minha mãe usou lençóis de pano cru para fazer as primeiras roupas”, disse Joaquina Pires.

O Grupo Cultural Cana Verde continua a usar trajos típicos da vila do Soajo, que são representativas das regiões minhotas de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca.

A música ao vivo sempre foi um elemento importante desde a fundação do grupo. José Branco foi o seu primeiro acordeonista. Permaneceu no grupo até 1986, quando este interrompeu a sua atividade. Em 1994, o Grupo Cultural Cana Verde foi ressuscitado por Joaquina Pires, que contou com o apoio de Baltazar Oliveira, considerado por muitos o melhor acordeonista de Montreal.

Desta vez, o grupo também contou com a participação de muita juventude. A filha de Baltazar Oliveira, Carla, foi uma dessas jovens que se juntou ao rancho. “O grupo foi reavivado com algumas pessoas [do grupo anterior] que começaram a integrar os seus filhos. Aprendemos que, para sobrevivermos, precisávamos de integrar os jovens. No entanto, o grupo nunca foi muito grande. Somos uma organização sem fins lucrativos registada no Quebeque, mas nunca pertencemos a uma associação. Sempre fomos independentes. Às vezes isso causa alguns problemas porque temos que procurar lugares para ensaiar, mas sempre tentamos manter um bom relacionamento com todos. [No entanto], está a ficar difícil encontrar pessoas para dançar. Esse tem sido o nosso maior desafio”, lamentou Carla Oliveira.

Grupo Cultural Cana Verde

Ao longo das suas quatro décadas de existência, o grupo utilizou diferentes locais para ensaiar. Começou na extinta igreja onde Fernando Pires um dia trabalhou, e depois passou pela Associação Portuguesa do Canadá, pela Casa do Benfica, pelo Centro Comunitário Santa Cruz e pela Igreja de São Miguel. Antes da pandemia paralisar todas as atividades, tinha regressado às instalações da Associação Portuguesa.

Assim que o grupo foi formado, não tardou a demonstrar o seu talento pela comunidade. Em 1980, foi convidado a participar no Planète, um programa popular de televisão da Rádio Quebec que promovia as diversas culturas estabelecidas na província. Ao longo das últimas quatro décadas, participou também em várias celebrações tanto na comunidade portuguesa como na francófona. No entanto, havia um evento anual específico pelo qual todos os elementos do grupo ansiavam com expectativa, como relata Carla Oliveira: “Os elementos perguntavam sempre se íamos dançar no São João. Esse é o evento que tem mais impacto em nós. O Benfica organizava um grande São João e todos esperávamos por esse dia. O outro era o 10 de junho. Sabíamos que precisávamos de estar preparados para ambos.”

O grupo também já atuou nos Estados Unidos da América, Gatineau e Otava. Um dos seus maiores objectivos é atuar em Portugal, mas tal não ocorreu…ainda.

O Grupo Cultural Cana Verde tem-se colocado na vanguarda da inovação em muitos aspectos do foro folclórico local. Em 2016, implementou as 'Noites de Rusgas' em diversos restaurantes de Montreal. O evento culminou com uma grande celebração na Igreja de São Miguel, onde centenas de participantes tiveram a oportunidade de apreciar os elementos culturais do evento e de saborear vários pratos tradicionais. A noite terminava sempre com uma sessão informal de danças folclóricas em que todos os presentes eram convidados a participar.

Esta iniciativa levou à criação do 'Grupo de Bombos', uma secção totalmente nova que ganhou extrema popularidade na região, como relatou Carla Oliveira durante a nossa conversa: “A ideia partiu das 'rusgas' de S. Miguel. Outros grupos de Montreal, e alguns dos Estados Unidos, foram convidados a participar.”

Grupo de Bombos na Parada do Dia de Portugal 2019, em Montreal

“Nos últimos anos, o 'Grupo de Bombos' gerou muito interesse e alcançou milhares de pessoas. É mais fácil recrutar pessoas para os 'bombos' do que para o rancho”, complementou Joaquina Pires.

O mundo sofreu mudanças extremas em 2020 devido à pandemia de Covid-19, o que afetou todas as nossas organizações comunitárias espalhadas pelo Canadá. O Grupo Cultural Cana Verde não é exceção. “Esta pausa tem grandes implicações. Somos um grupo de adultos, mas muitos de nossos membros já têm mais de 60 anos. O meu pai tem 76 anos e minha mãe 70. Isso é um reflexo de que perdemos dois anos de qualidade com essas pessoas. No que diz respeito à música, sabemos que quando o meu pai não puder mais, teremos um problema. Para ser franca, o meu pai é o melhor tocador de acordeão em Montreal. Terminada a pandemia, teremos que nos reunir para avaliar a situação, se os membros querem continuar, sabendo muito bem que talvez não tenhamos muito mais tempo com o meu pai. Acho que, individualmente, alguns já pensaram nisso. Se o Cana Verde deixar de existir, quem gosta de dançar vai encontrar outro grupo”, disse Carla Oliveira, para depois refletir: “Quando acabar a pandemia, talvez o Grupo de Bombos seja o que vai ficar”.

A avaliação de Carla Oliveira sobre a realidade atual é corroborada por Joaquina Pires: “Como temos outros grupos ativos [em Montreal], não há necessidade de formar mais. É melhor continuarmos [unicamente] com os 'bombos'.”

Embora o Grupo Cultural Cana Verde já não tenha capacidade de cumprir com o seu objetivo inicial, aquando da sua formação, manterá, através do Grupo de Bombos, a sua missão de divulgação e preservação de um elemento cultural português de elevada relevância. Este é um sinal de adaptação e de capacidade de reinvenção, duas características cruciais para a sobrevivência das nossas organizações comunitárias nos tempos que decorrem.

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