Sudbury

POPULAÇÃO DE SUDBURY: 166,004

ESTATÍSTICAS RELACIONADAS COM OS PORTUGUESES EM SUDBURY:

COMO LÍNGUA
MATERNA
COMO MAIS
FALADA
CONHECIMENTO
DA LÍNGUA
NASCIDOS
PORTUGAL
ORIGEM
ÉTNICA
20
(0.01% da população)
10 (0.001% da população)40
(0.02% da população)
30
(0.02% da população)
85
(0.05% da população)
Fonte: Statistics Canada

RESILIÊNCIA E AMBIÇÃO DE UMA ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA EXTINTA NUMA CIDADE COM POUCOS PORTUGUESES

Artigo escrito por Paulo Pereira para a Revista Luso-Ontário, 2008

Versão de áudio (disponível apenas em inglês):

Na edição número 2 (março de 1993) de um boletim que o Clube Português de Sudbury lançava mensalmente, Francisco Martins – que foi o primeiro presidente e atualmente reside em Toronto – relata uma entrevista que conduziu com o pioneiro português desta cidade, Marcelino Zenha: “Ele foi dos primeiros (segundo o próprio Sr. Zenha, ele foi o primeiro ou o segundo uma vez que veio com o Sr. Pacífico Pinho) […] e foi dos primeiros portugueses a chegar ao Canadá. […] …Resolvemos dar a palavra ao Sr. Zenha: Tinha 35 anos quando cheguei ao Canadá em maio de 1954 […] Por ter visto no jornal que precisavam de estofadores em Sudbury para uma oficina nova, falei em tal ao Pacífico. [...] Fizemos as malas e lá estávamos a caminho de Sudbury. Uma vez aqui, fomos à oficina do patrão, que era alemão, ele contratou-nos, a mim pagando-me $3.75 à hora e eu todo contente [...] . Entretanto, apareceu a venda de uma oficina de estofador, eu aproveitei e comprei-a, assim, comecei a trabalhar por minha conta. Como eu era sozinho e o meu inglês era pobre, tinha muitas dificuldades [...]. Eu vivia num um quarto arrendado que incluía cama e mesa, e muitas semanas o dinheiro não chegava para pagar a renda, visto que tinha de pagar a hipoteca da oficina.”  

Cinquenta anos depois, a história da comunidade portuguesa de Sudbury ganhou novos e interessantes contornos e deixou marcas que ainda permanecem vivas na memória de cada português que reside ou viveu nesta cidade. Maria Pereira, Manuel Pereira e Maria Clara Beites fazem parte desta bela história e tiveram a gentileza de a partilhar connosco.   

Manuel Pereira chegou a Sudbury em 1972. “Havia poucos portugueses… Vim para casa do meu pai. Não sei exatamente quantos, mas havia poucos. Não tinha um clube, um bar, nada. As pessoas juntavam-se na casa do meu pai, que veio de Quequebe, depois para Elliot Lake, e depois mudou-se aqui para Sudbury e trabalhou sempre em borracha. Eu comecei a trabalhar em borracha em 1973 e lá continuo. Os portugueses aqui trabalham mais na construção”, começou por nos contar.  

Da esquerda para a direita: Maria Pereira, Manuel Pereira, Maria Clara Beites

A sua esposa, Maria Pereira, chegou em 1977, enquanto Maria Clara Beites já cá estava em 1974. “Foi difícil a adaptação”, começou por dizer-nos Maria Pereira, a última presidente do falecido Clube Português. “Não falava a língua, não conhecia ninguém português. Aqui é precisa falar inglês, não é como em Toronto. Quando o meu marido veio para cá, havia cerca de dez casais portugueses. O pai dele foi dos primeiros a vir para o Canadá, naquela altura havia três ou quatro famílias. Não havia convivência. Depois, quando eu vim, passados cinco anos, começámos a conhecer outras famílias e eu estava aqui há um ano e meio quando o clube começou. Foi aí que a malta começou a juntar-se, já havia cerca de 60 ou 70 famílias. Neste momento, há mais portugueses do norte de Portugal, mas a uma certa altura tínhamos de toda a parte de Portugal, incluindo as ilhas. Mas sempre houve mais gente do Norte. Atualmente, existem cerca de 25 ou 30 famílias aqui, talvez 90 a 100 pessoas”, divulgou. 

“O fundador do clube foi o Francisco Martins, que agora mora em Toronto”, interveio Maria Clara Beites. “O Carlos Jorge, Félix Lopes, José Ferreira, Alberto Teixeira e Ezequiel Mealha também foram fundadores. Um grupo de homens juntos andaram pelas portas a perguntar as opiniões das pessoas. Todo mundo assinou, houve uma reunião, foram a votos e fizeram uma direção em 1978. A primeira festa foi em junho, mas foi em abril que tudo começou. As pessoas aderiram, todos andavam animados. A primeira festa foi muito bonita...casa cheia. Houve duas festas esse ano”, lembrou. 

A conversa estava agora animada com os nossos entrevistados a recordar um passado saudoso. "Tivemos rancho desde o segundo ano do clube e também tivemos futebol desde essa altura”, atirou Maria Pereira. “Fizemos umas poucas peças de teatro, tivemos um grupo coral. Chegámos a um tempo que tínhamos três grupos folclóricos: adultos, jovens, e crianças. Representávamos o Minho, Santa Marta de Portuzelo. A música era gravada e a primeira ensaiadora foi a Fernanda Matos.”  

Rancho Folclórico

Tanto Maria Pereira como Maria Clara Beites fizeram parte do rancho, inclusivamente como ensaiadoras. “O rancho foi a Sault Ste. Marie, a Elliot Lake, a Toronto, a Parry Sound. Nós viajámos. O rancho acabou antes do clube terminar. Acabou por falta de elementos”, lembrou Maria Clara. 

“O Clube esteve forte por 20 anos, até aos finais dos anos noventa. Ainda fizemos festas até 2003, mas estava fraco”, recordou Maria Pereira. “A malta portuguesa começou a sair daqui para fora e nós não faziamos festas só para os portugueses, mas também os canadianos, que nos valiam. Tinhamos muitos sócios que eram canadianos. Alugávamos os salões para fazer as festas, não tínhamos sede própria. Chegámos a ter uma escola de português. A escola portuguesa começou logo no segundo ou terceiro ano do clube. Tínhamos duas professoras que chegaram de Portugal e ensinavam aqui. Tínhamos muitos alunos. Era ao sábado de manhã. As pessoas chegam a uma certa altura e perdem o entusiasmo. Quando as pessoas que estavam dentro da direção começaram a estar cheias e os sócios não queriam tomar conta, reparámos que as coisas íam acabar mais tarde ou mais cedo. Eram quase sempre as mesmas pessoas envolvidas. Nós fazíamos as festas à nossa maneira portuguesa, e eram as pessoas que estavam envolvidas que preparavam as coisas, e isto cansa. Nós tínhamos quatro festas: o Aniversário em abril, a festa do Dia da Mãe, muitas vezes o Dia do Pai, o Dia de Portugal onde íamos levantar a bandeira à Câmara Municipal, onde o  rancho atuava e o de Elliot Lake vinha ajudar a gente. Tivemos aqui uma apresentação de quadros por três dias. Aquilo foi uma coisa boa para a nossa comunidade. Se os portugueses estivessem interessados, podiamos ter feito outras coisas bonitas. Agora não temos pessoas suficientes, não temos possibilidades. Eu estive como presidente durante 12 anos. O clube acabou há dois anos, em 2005. Fazíamos um boletim semanal desde 1978 e enviávamos para os sócios. Era tipo o jornal comunitário. Isto terminou em meados dos anos noventa. Aqui na nossa comunidade portuguesa temos alguns negócios portugueses e eles é que patrocinavam. Não temos aqui restaurantes portugueses, mas temos grandes companhias que têm donos portugueses. Não existe uma padaria, um restaurante. Temos um português que tem um Café mas os portugueses não vão lá, só os canadianos”. Maria Pereira exalou, nostálgica.  

Silêncio apoderou-se da conversa! 

“Eu sinto-me triste por ter acabado, mas somos muito pouqinhos, não somos ninguém”, suspirou Maria Beites. “Nós fazíamos dois ou três piqueniques todos os verões, fizemos excursões com as crianças da escola. Os nossos jovens não vão esquecer a língua nem as raízes enquanto estivermos vivos, mas de resto, com o tempo, tudo vai acabar. Os jovens quase todos falam português, eles têm orgulho de ser portugueses”, afirmou. 

Manuel Pereira entrou na direção em 1988, foi vice-presidente e depois presidente, mas mesmo antes de se tornar diretor já participava na vida do clube. “Sempre ajudei quando não fazia parte da direção, principalmente quando minha esposa foi presidente”, realçou. Maria Pereira acabou mesmo por ser a última presidente após 12 anos consecutivos no cargo, mas já antes havia feito parte do rancho folclórico como dançadora e ensaiadora. Maria Clara Beites – que também foi dançadora e ensaiadora do grupo – sempre apoiou Maria Pereira, primeiro como secretária e diretora de culinária, e depois como vice-presidente até à extinção do Clube Português de Sudbury. 

Mais de meio século após a chegada de Marcelino Zenha a Sudbury, o futuro da comunidade portuguesa nesta cidade ameaça espelhar aqueles tempos pioneiros.

Com ficheiros da Revista Luso-Ontário, 2008
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